Entre 78/87 no Brasil ocorreu uma efusividade artistica e política que, por assim dizer, pode se chamar de trágica. O trágico é aquele momento em as potências em jogo recolocam numa situação em que o velho precisa ser destruído e o novo criado. Nestes momentos surgem vontades que revelam potências em disputa, tais vontades manifestam-se sempre por meio de um eu que expressa um novo modelo estruturador da realidade.
Assim, Renato Russo e sua Legião embalaram os sonhos e as esperanças de toda uma juventude que ansiava por este acontecer que teve seu ápice em 1988, com a constituinte, foram centenas de emendas populares. Nelas materializou-se a decadência da potência que inspirava o sentido trágico da rebeldia, nela ocorreu a síntese possível dos novos princípios estruturadores que deveriam nortear a sociedade brasileira.
Quando tal momento chega a seu ápice retrai-se novamente aquilo que buscamos, a verdade, que só se revela como eterno movimento. Contudo, antes disto pode ser que alguns representantes desta vontade tenham a solidez, o cinismo e a malignidade de ver através da verdade; de produzir algo assim como esta música que deixo aí pra vocês. Revelando-nos que enquanto à buscamos, a verdade, mantém-se retraída e que já sempre imergimos nela enquanto seres humanos agregadores de sentido e significado para nossa própria existência. Enfim, que todo (e só) o vir-a-ser é a verdade em si mesma.
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Quando na minha infância esta canção sempre me causou curiosidade, ficava horas tentando singularmente, por versos, ou em gênero, pela música e seu contexto descobrir algo que fosse o fio de cobre amarrado no pescoço, o fio condutor que me explicaria o que deu na cabeça do Renato Russo pra escrever uma loucura destas.
Somente agora eu entendi o daimon que se apossou dele, o próprio emergir na verdade, no caos e na falta de sentido do mundo é que falou por meio de sua poesia. Este desvelar-se só é possível por um movimento que não se encontra em generalidades ou particularidades mas numa imersão na própria consciência, num despir de preconceitos. Por seu turno, este despir abre um novo mundo, um campo. Este é um locus onde se deixa tudo ser como é, ou seja, na sua própria dinâmica do vir-a-ser.
Pretensiosa? Sim, esta canção o é! Sabemos hoje que é pretensão demais que um eu possa dizer a verdade mas a seu modo e segundo suas vivências é possível alcançar algo assim como um relance, um imergir que desvela. Neste o “mundo verdadeiro” pode mostrar-se como realmente é, ou seja, como fábula da consciência. Mas este mesmo eu que deu voz ao falar da verdade, ao envio em que ela o destinou, pertence a ela, mesmo que não o saiba e, por isto, é de se esperar que em algum momento ele volte a encontrar-se e a ver algum sentido em seu significado.
Foi esta, certamente, a sensação que se apoderou de mim quando repentinamente me pus a pensar, voltando me para mim mesmo, no sentido de uma música que há muito eu havia esquecido, como um brinquedo que não tinha conseguido montar. Por tal desvelamento percebi também a criança interna que nunca esqueceu do jogo de buscar correspondência sem perceber que não há qualquer correspondência possível sem que aja um princípio estruturador que a estabeleça. Assim, não há qualquer verdade sem que se abra um campo onde o mundo possa se mostrar e na constituição de um suporte, de um eu, se fixe um princípio estruturador da realidade.
Um comentário:
Really funny video..
thanks for the laugh :)
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