Por estes dias a poesia tornou-se forma de oração e deixei, pela primeira vez o eurocentrismo de lado para falar das entidades e dos mitos afrobrasileiros. Ahh quanta tragédia há ali, quantos oráculos. O nome afro-poesias, é claro, uma homenagem ao poetinha e seus afro-sambas, mas oxalá, pudesse eu ter seu brilhantismo ou ser tomado por um gênio.
As homenagens que me renderam aos Orixás e guardiões são, é claro, um convite. Um convite a esta terra desconhecida e tomada de tanto preconceito que é a cultura afrobrasileira. A quanto esperávamos o renascimento da tragédia? E ele teve de ocorrer justamente aqui em nosso País, saravá mais uma benção a este povo.
Mas quê, tragédia? Sim, foi ela quem renasceu para nos contar da simplicidade e da humildade com que entes de luz faziam sua magia e, com isto, voltar a diferenciar o sacrilégio do pecado. Ora enquanto o primeiro é um ato dos homens tomados na relação de buscar a si próprios e conectar-se com o mundo, o segundo é um ascetismo venal voltado à relacionar-se com o inexistente, ou seja, um Deus antropormorfizado.
As afro-poesias nos lembram do lenitivo que é poder contar com conforto e da punição por tentar desconcatenar o fio que os deuses traçaram. Em todas elas verás entidades cheias de ensinamentos acerca daquilo que ama se esconder: a verdade; em todas elas se aproximará da inexistência da distância entre o bem e o mal, e seu livre trânsito em nossos corações.
É disto que se trata o sacrilégio do furto das possibilidades vitais, do desejo de chegar ao cerne de todas as coisas, em suma, de interiorizar-se. Ora, se pensarmos bem, o que mais precisava o povo brasileiro do que interiorização? Não se trata aqui de mera apologia ao culto, mas de constatar o renascimento de uma esperança, a esperança que mais uma vez possamos ser homens, Assim como Xangô que por vaidade provocou uma tragédia sobre sua vila ou, por amor, roubou a mulher de Ogum, será amigos isto não te lembra o Édipo ou Paris?
Então diga-me que aceitas, diga-me que o convite a ler as afropoesias estas rústicas formas de oração poderá retirar-lhe do mundo do sonho virginal e colocar-lhe dançando entre os Ogãs. Por que, desde que, nos dispamos de todo preconceito temos, nós também, uma mitologia linda pra contar. Quantos bardos serão necessários para que ela possa ser contada? Quanto será necessário para que a tragédia possa renascer daqueles que foram seus braços acolhedores, ou nem tanto?
Se viajarem sobre os pequenos elementos de magia e perceberão a cultura negra soltando seu fogo, vento, agua e terra para transformar novamente o mundo em magia e reencantar nossa vida com os ensinamentos simples que vêm das histórias sofridas e das vidas de Orixás e Exús, que assim como os deuses do Olimpo, tem seu descanso em Aruanda, mas vivem entre nós para que na tragédia possamos tornar outra vez a sermos homens.
Salve a cultura negra, saravá nosso povo, nossa terra e todo lenitivo que nos faz aceitar as tragédias diárias das mazelas sociais sem desistir, assim como este povo de Aruanda.
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