José
Abdias era escritor e como todo bom inventor dedicava sua vida às
suas criaturas. Estas feitas de palavras ganhavam vida feito
alquimia, feito um sonho angelical que traz conforto e paz. Por elas
deixou tudo, pais, mães, filhos, ou melhor, passou a ter únicos
filhos os sonhos e pesadelos que trazia à vida, sim, trazia à vida
para o conforto de pobres como eu.
Certo dia
caminhando pela cidade tive notícias de sua morte, mas como justo
agora em que o impalpável juntou suas
pontas à matéria, justo agora que seu brilhantismo em fim se
revelou. Como pode ter morrido um gênio que ressuscitou o genêro
trágico em nossas vidas e ainda tinha tanto a nos oferecer. Justo
ele que de bom grado aceitou ser uma ponte entre este mundo e o mundo
virginal do sonho. Tudo que pude foi ficar ali, parado naquela mesa
de bar atônico, impávido.
Olhem não
fui só eu, há muito não via uma morte causar tamanha comoção
fosse por seu espírito bem aventurado, pelas gorgetas que sempre
deixava nas esquinas que passava, pela morte prematura, pela dor de
perder um homem que dedicou sua vida a um único sacerdócio, o das
palavras, todos estavam comovidos, chorosos. Mesmo aqueles que o
odiavam sabiam da falta que faria, mesmo aqueles que lhes eram
indiferentes sabiam que uma luz no mundo houvera se apagado.
Quanto a
mim? Não, não se tratava de de tristeza, nem de dor mas de pura
curiosidade. Daquelas que arrebatadoramente nos tomam, nos enchem, e
angustiam o fundo de nosso ser. Sentia sim sua morte mas não como uma
dor qualquer, mas como a própria dor do escritor própria dor que ele devia
ter deixado, não a morte mas o fim de sua história, o fim do único
homem que poderia juntar as pontas entre aquilo que sempre é e
aquilo que está sendo.
Se
houvesse um obituário nada poderia dizer ou sequer descrever quem
foi este homem, por que como os sons ele subia sua freqüência até
lugares que jamais nós pobres mortais poderíamos alcançar e, ainda
assim, nos deleitávamos. A uma distância segura é claro, estrelas brilham e erradiam calor e nós, pobres mortais jamais
poderíamos, verdadeiramente, nos aproximar. Tudo que restou foram
prostitutas falando sobre sua grandiosidade e o “sexo” do nobre
autor, sim, seu “sexo”, suas palavras. Entre críticas literárias
e choros familiares sabemos que jamais deixarão que José Abdias de fato
morra e vá até o lugar onde o impalpável pelo qual tanto deu, é
real. Que destino cruel para quem só quis o bem
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